Pergunta a Osho: Frequentemente, quando estou profundamente relaxado, um forte sentimento de morte surge em mim. Nesses momentos, eu me sinto como parte de todo o cosmos, e quero desaparecer nele. Por um lado, é uma bela sensação e eu fico muito grato por ela; por outro lado, desconfio disso: talvez eu não tenha dito "sim" a mim mesmo, ao meu ser, se o desejo de morrer é tão forte. Isso é um desejo suicida?
Não se trata de um desejo suicida.
Uma coisa básica sobre suicídio é que ele surge somente nas pessoas que estão muito apegadas à vida. E quando elas fracassam no seu apego, a mente se move para o polo oposto. A função da mente é a de "ou/ou": ou ela quer tudo, ou ela não quer nada.
A ânsia pela vida não pode ser realizada totalmente, porque a vida, como tal, é uma coisa temporal; ela está fadada a acabar num certo ponto. Você não pode ter uma linha somente com o começo; num lugar ou noutro, fatalmente haverá um fim.
Assim, as pessoas que cometem suicídio não são contrárias à vida — somente aparentam ser. Elas querem a vida na sua totalidade, elas querem apossar-se dela toda e, quando fracassam — estão fadadas a fracassar —, então, da frustração, do fracasso, elas começam a pensar em morte.
Aí então, o suicídio é a única alternativa. Elas não se sentirão satisfeitas seja com o que quer que a vida lhes ofereça — querem mais e cada vez mais e mais. A vida é curta e a série de desejos de ter cada vez mais e mais é infinita, então o fracasso é certo. Num lugar ou noutro, chega-se fatalmente a um momento em que elas sentem que foram trapaceadas pela vida.
Ninguém as está trapaceando — elas trapacearam a si mesmas. Elas andaram pedindo em demasia, e estiveram somente pedindo, não estiveram dando nada, nem mesmo agradecimentos. Na raiva, na ira, como vingança, o pêndulo da mente se move para o outro lado — contudo, elas não sabem contra quem estão se vingando. Elas estão matando a si mesmas — isso não destrói a vida, não destrói a existência.
Sendo assim, esta sua experiência não é de natureza suicida. É algo similar ao suicídio, mas em um nível diferente e vindo de uma dimensão totalmente diferente.
Quando você está relaxado, quando não existe nenhuma tensão em você, quando não há nenhum desejo, quando a mente está tão silenciosa quanto um lago sem ondulações, surge em você um profundo sentimento de desaparecer naquele momento, porque a vida não lhe deu nada melhor do que isto. Houve momentos de felicidade, de prazer, mas aquele é algo muito além da felicidade e do prazer: é pura bem-aventurança.
Sair dele é realmente penoso. A pessoa tem que ir mais fundo, e ela vê que ir mais fundo significa desaparecer. A maior parte dela já desapareceu no relaxamento, no silêncio, na ausência de desejos. A maior parte da sua personalidade já morreu, apenas um pequeno fiapo de ego ainda está ali dependurado ao redor.
E ela gostaria de dar um salto para fora do círculo do ego, porque, se o relaxamento, mesmo com o ego, pode trazer tanta bênção, a pessoa não pode nem imaginar qual seria o resultado se tudo se dissolvesse, de modo que ela pudesse dizer: "Não sou e a existência é."
Isso não é instinto suicida. Isso basicamente é o que se quer dizer por libertação espiritual: é a libertação do ego, do desejo, até mesmo do desejo pela vida. É a total liberação, é a absoluta liberdade.
Mas, nesta situação, esta questão está fadada a surgir em todo mundo. A questão está surgindo não da sua inteligência: a questão está surgindo da sua covardia. Você realmente quer uma desculpa para não se dissolver, não se evaporar dentro do infinito.
Imediatamente, a mente lhe dá a ideia de que o suicídio é isso — "Não cometa suicídio. Suicídio é pecado, suicídio é um crime. Retorne!". E você começa a retornar. E "retornar" significa tornar-se tenso novamente, novamente cheio de ansiedades, novamente cheio de desejos. Novamente todo o trágico drama da sua vida...
Isso é o seu medo da total dissolução. Mas você não quer aceitar isso como medo, assim, você lhe dá um nome condenatório — suicídio. Não tem nada a ver com suicídio; isso é realmente entrar mais fundo dentro da vida.
A vida possui duas dimensões. Uma é horizontal — na qual todos vocês estão vivendo, na qual vocês estão sempre pedindo por mais e cada vez mais e mais. A quantidade não é a questão; nenhuma quantidade vai satisfazê-los.
Isso é o seu medo da total dissolução. Mas você não quer aceitar isso como medo, assim, você lhe dá um nome condenatório — suicídio. Não tem nada a ver com suicídio; isso é realmente entrar mais fundo dentro da vida.
A vida possui duas dimensões. Uma é horizontal — na qual todos vocês estão vivendo, na qual vocês estão sempre pedindo por mais e cada vez mais e mais. A quantidade não é a questão; nenhuma quantidade vai satisfazê-los.
A linha horizontal é a linha quantitativa. Você pode ir seguindo sem parar. Ela é como o horizonte — à medida que você segue adiante, o horizonte continua recuando. A distância entre você e a meta do seu "cada vez mais", a meta do desejo, permanece sempre a mesma.
Ela era a mesma de quando você era uma criança, era a mesma de quando você era jovem, será a mesma quando você for idoso. A distância permanecerá a mesma até o seu último suspiro.
A linha horizontal é uma ilusão. O horizonte não existe, somente aparenta — lá, talvez a apenas algumas milhas de distância, o céu esteja encontrando-se com a terra. Eles não se encontram jamais. E a partir do horizonte vem a linha horizontal — sem fim, porque a meta é ilusória; você não pode torná-la realidade.
E a sua paciência é limitada, seu período de vida é limitado. Um dia, você percebe que tudo parece fútil, sem significado: "Estou me arrastando sem necessidade, me torturando, chegando a lugar nenhum..." Aí então o oposto surge em você — "Destruir-se. Não vale a pena viver, porque a vida promete, mas jamais dá o prometido."Mas a vida tem uma outra linha — uma linha vertical. A linha vertical se move em uma dimensão totalmente diferente. Em tal experiência, por um momento, você vira sua face na direção vertical.
Você não está pedindo — eis por que está recebendo.
Você não está desejando — eis por que tanto torna-se disponível a você.
Você não tem uma meta — eis por que você se aproxima tanto dela.
Devido a não haver nenhum desejo, nenhuma meta, nenhuma pergunta, nenhum pedido, você não tem qualquer espécie de tensão — você está completamente relaxado.
Nesse estado relaxado está o encontro com a consciência.
O medo surge no momento em que você chega ao ponto de dissolver sua última parte, porque, então, será irrevogável: você não será capaz de retornar.
Já contei muitas vezes um belo poema de Rabindranath Tagore. O poeta estava procurando por Deus há milhares de vidas. Ele o via às vezes, lá longe, próximo a uma estrela, e ele começou a mover-se naquele caminho, mas, no momento em que chegou àquela estrela, Deus mudou-se para outro lugar.
Mas ele continuou procurando e procurando — ele estava determinado a descobrir a casa de Deus — e a surpresa das surpresas foi que, certo dia, ele de fato chegou a uma casa onde na porta estava escrito: "Casa de Deus".
Você pode compreender o seu êxtase, pode compreender sua alegria. Ele corre escada acima e, bem na hora em que ia bater à porta, de repente sua mão gela. Surge-lhe uma ideia: "Se por acaso esta for realmente a casa de Deus, então, estou morto, minha busca acabou. Fiquei identificado com a minha busca, com a minha procura. Eu não sei fazer mais nada... Se a porta se abrir e eu encontrar-me com Deus, estou morto... — acabou-se a busca. E depois? Depois há uma eternidade entediante — nenhum excitamento, nenhuma descoberta, nenhum desafio novo, pois não pode haver nenhum desafio maior do que Deus."
Ele começou a tremer de medo, tirou os sapatos dos pés e desceu de volta os lindos degraus de mármore. Ele tirou os sapatos, de modo que não fosse feito nenhum barulho, pois o seu medo era até de fazer barulho nos degraus... Deus podia abrir a porta, embora ele nem tivesse batido. E, então, ele correu tão depressa quanto jamais correra antes.
Ele pensava que estava correndo atrás de Deus tão depressa quanto podia, mas nesse dia, subitamente, ele encontrou a energia que jamais tivera antes. Correu como jamais tinha corrido, sem olhar para trás.
O poema termina assim: "Eu ainda estou procurando por Deus. Conheço sua casa, assim a evito e busco em outro lugar. A excitação é grande, o desafio é grande e, na minha busca, eu prossigo, continuo a existir. Deus é um perigo — eu seria aniquilado. Mas agora eu não tenho medo nem de Deus, porque conheço Sua casa. Sendo assim, deixando de lado a Sua casa, continuo procurando por Ele, ao redor de todo o universo. E lá no fundo eu sei que minha busca não é por Deus: minha busca é para nutrir o meu ego."
Eu coloco Rabindranath Tagore como um dos maiores religiosos do nosso século, embora ele não seja, comumente, relacionado à religião. Mas somente um homem religioso de enorme experiência poderia escrever este poema; não é apenas uma poesia comum: ela contém uma grande verdade.
E é isso o que a sua questão está levantando. Relaxado, você chega a um momento em que você sente que vai desaparecer, e então você pensa: "Talvez isto seja um instinto suicida."; e retorna ao seu velho mundo miserável. Mas esse mundo miserável possui uma coisa: ele protege o seu ego, permite-lhe ser.
Esta é uma estranha situação: a bem-aventurança não permite você; você tem de desaparecer. É por isso que você não vê muitas pessoas abençoadas no mundo. A miséria nutre o seu ego — é por isso que você vê tanta gente miserável no mundo. O ponto central, básico, é o ego.
Sendo assim, você não chegou a um ponto de suicídio. Você chegou a um ponto de nirvana, de cessação, de desaparição, do apagar da vela. Esta é a última experiência. Se você puder juntar coragem... só mais um passo... A existência está apenas a um passo distante de você.
Não dê ouvidos ao lixo da sua mente, dizendo que isto é suicídio. Você não está bebendo veneno, nem se dependurando numa árvore, e nem tampouco dando um tiro de revólver em si mesmo — onde o suicídio?
Você está simplesmente tornando-se mais tênue e cada vez mais e mais tênue. E chega um momento em que você está tão diluído e tão espalhado por toda a existência, que você não pode dizer que você é, mas pode dizer que a existência é.
A isto chamamos de iluminação, não de suicídio.
A isto chamamos de realização da suprema verdade. Mas você tem de pagar o preço. E o preço não é nada, senão o abandono do ego. Sendo assim, quando um tal momento vier, não hesite. Dançando, desapareça... com uma grande gargalhada, desapareça; com canções em seus lábios, desapareça.
Eu não sou um teórico, isto aqui não é uma filosofia minha. Eu cheguei à mesma linha limítrofe muitas vezes, e retornei. Eu também encontrei a casa de Deus muitas vezes e não pude bater. Jesus tem alguns dizeres... Um dos dizeres é este: "Bata, e a porta se abrirá para você." Se esta frase tem algum sentido, este é o sentido que estou lhe dando agora.
Assim, quando esse momento vier, regozije-se e dissolva-se. É da natureza humana — e compreensível — que muitas vezes você retorne. Mas essas muitas vezes não contam. Uma só vez, junte toda a coragem e dê um salto.
Você será, mas de modo tão novo, que não poderá conectá-lo com o velho. Será uma descontinuidade. O velho era tão frágil, tão restrito, tão medíocre... e o novo é tão vasto... De uma pequenina gota de orvalho, você tornou-se o oceano.
Mas até mesmo uma gota de orvalho, ao escorregar de uma folha de lótus, treme por um momento, tenta agarrar-se um pouco mais, porque ela já pode ver o oceano... uma vez que tenha caído da folha de lótus, acabou-se.
Sim, de certo modo, ela não mais será — como uma gota de orvalho, ela terá deixado de ser. Mas isso não é uma perda. Você será oceânico.
E todos os outros oceanos são limitados.
O oceano da existência é ilimitado.
Osho, em "Além da Psicologia — Discursos no Uruguai"